Goioerê Publicada em 02/06/18 às 15:20h
30 ANOS ASSALTO A BANCO DO BRASIL GOIOERÊ: Freira fica famosa em todo o brasil e esperava recompensa de 3 milhões de cruzados
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ESTA MATÉRIA É UMA REPRODUÇÃO DO JORNAL DO BRASIL
(Rio de Janeiro 11 de junho de 1988).
Aos 44 anos, a carioca Salete Maria Neves
Vieira ficou famosa. Frequentou as páginas
dos jornais e as manchetes nas televisões.
Mais conhecida como irmã Letícia - a religiosa
que acompanhou como refém os dois assaltantes
do Banco do Brasil na cidade paranaense de
Goio-Erê - espera agora receber a parte do
dinheiro que lhe foi prometida pelos ladrões a
título de doação. Não sabe ao certo qual o
quinhão que lhe cabe e nem mesmo se verá a cor
desse dinheiro. Os dois assaltantes deixaram um
bilhete com o gerente do Banco, Elias Famelli,
pedindo que uma parte dos Cz$ 3 milhões
devolvidos fosse entregue à irmã Letícia e a duas
meninas gêmeas que nasceram cegas.
Descansando no Rio dos dias de tensão,
irmã Letícia planeja dar o dinheiro a sua mãe,
Jurema, de 73 anos. Viúva, ela mora com uma
irmã num apartamento no bairro de Copacabana.
"Eu não pedi nada. Foi espontâneo da parte deles", diz a freira, que não vê nenhum mal em
embolsar esse dinheiro. "Não é dinheiro de
assalto, é o banco que vai doar", argumenta.
Quando recebeu o hábito da Ordem da
Imaculada Conceição, há 21 anos, num convento
em São Paulo, Salete Vieira ganhou um novo
nome - Letícia significa alegrias é assim que ela
se comporta, sempre sorridente. Sua adolescência
foi vivida em Copacabana, ao lado dos pais - um gerente da indústria de máquinas Singer e
uma auxiliar de enfermagem - e dedicada únicamente
aos estudos. A adolescente carioca estudou
inglês, aprendeu violão e piano e fez o curso
Normal num colégio de freiras na Tijuca. Nunca
namorou e tampouco sonhou em casar e ter
filhos. A atual irmã Letícia jura que sua vocação
é inabalável. "Eu me sinto plenamente realizada
como religiosa", afirma. Essa, no entanto, não é
a opinião de suas superioras. No convento da
Ordem da Imaculada Conceição, no município
paulista de Itu, a irmã Maria José considera que
irmã Letícia não tem as virtudes necessárias para
encarar a vida religiosa. "O problema principal é que ela não cumpre o voto da obediência. Só
faz o que quer. Nem tem temperamento para viver na clausura".
inho
Punição — Há seis meses, o convento
paulista tem em mãos um documento da Sagrada
Congregação dos Religiosos, um órgão do
Vaticano, determinando que irmã Letícia abandone
o hábito. Nesse momento, ela está num
período de exclaustração imposta, ou seja, não
pode voltar à clausura, o que contraria frontalmente
seus projetos. "Não vejo a hora de voltar
à vida de clausura e de orações", diz a freira,
que alimenta uma profunda devoção a Santa
Terezinha. Para ela, tirar a sorte grande seria ter
uma audiência particular com o papa João Paulo
II, uma das duas pessoas que ela mais admira (a outra é o cardeal-arcebispo do Rio de Janeiro,
D.Eugênio Salles).
Dos dois assaltantes, a irmã Letícia tem as
melhores lembranças. "Paulo e Lourenço foram
muito humanos e me pediram que em todas as
entrevistas eu desse uma mensagem aos jovens,
para não seguirem o caminho deles", conta. Ela
acredita no sincero arrependimento dos ladrões,
que até agora conseguiram driblar as investigações políais.
ais.
A bordo do avião que os levou de Goio-Erê
até local desconhecido, os passageiros - além dos
assaltantes e da freira, o padre Marcelino Bravo
e o piloto Irineu Dermachi - pouco conversaram.
A irmã puxou o terço e todos rezaram
durante boa parte da viagem.
Com vários parentes no Rio, que juntos
rezaram para que ela saísse ilesa do episódio,
irmã Letícia vai mandar celebrar missa de ação
de Graças na Igreja de São Paulo Apóstolo, em
Copacabana, antes de voltar a Goio-Erê, na
próxima semana. Ela continua torcendo para
que os ladrões se entreguem à polícia, seguindo
assim seus conselhos. "Só assim eles poderão
retomar uma vida normal", explica a freira, que
se sente "responsável diante de Deus" por eles.
Se forem presos, ela gostaria de visitá-los no
presídio. "Sempre estarei em oração pedindo
para que eles encontrem o caminho da Verdade",
afirma, mostrando-se uma crítica contundente
do atual sistema penitenciário do país, que deixa os presos confinados, em vez de fazê-los
trabalhar para pagar sua dívida à sociedade.
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